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Divina Pastora – Sergipe


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CEP 49650-000, Divina Pastora – SE

O Território

Igreja Matriz de Nossa Senhora da Divina Pastora/SE | Foto: Raquel Rezende.

Divina Pastora está localizada no Leste Sergipano, a 39 km de Aracaju, na microrregião de Contigua. Seu nome carrega a fé e a devoção pela padroeira que leva, anualmente, cerca de 120 mil devotos de diversas regiões do nordeste para a peregrinação que acontece no terceiro domingo de outubro.

O município está a 78 metros de altitude e do alto se observam serras e várzeas em meio aos velhos engenhos que remetem ao período da indústria açucareira. Além da memória dos canaviais, a cidade conheceu a exploração petrolífera na década de 60 e se tornou a quarta maior produtora de petróleo do estado, sendo essa uma das principais fontes de recursos do município.

Como nasce um polo criativo?

A fé também levou à cidade missionárias Irlandesas, que trouxeram consigo a tradição da renda dando a Divina Pastora o título de “território de fé, da renda irlandesa e do petróleo”. A igreja da padroeira se tornou santuário, lugar de crença, compromisso e devoção. Nossa Senhora Divina Pastora seria a representação do meio rural, sendo o povo do campo parte considerável dos peregrinos que caminham quilômetros ao encontro da fé.

Na igreja, encontra-se a última obra de José Teófilo de Jesus, pintor alforriado e um dos mais importantes pintores da primeira metade do século XIX, conhecido por suas pinturas sacras em igrejas de Salvador e Sergipe. José Teófilo faleceu em decorrência de uma queda de andaime enquanto pintava o painel da matriz de Nossa Senhora Divina Pastora, sendo para muitos um dos melhores painéis feitos pelo artista.

Entre fios e credos a cidade se constrói. Valoriza-se o tempo de criar rendas, enquanto contam-se histórias de vida, atraindo quem tem paciência para entender que é preciso sensibilidade para apreciar e ver acontecer, assim como a fé.

A renda irlandesa, em Divina Pastora, tem origem na religiosidade, chegando à cidade através de missionárias irlandesas que ensinaram algumas mulheres e, dessa forma, foram difundindo a técnica por todo a região. Dantas, citando Barreto (1995), conta:

“Ana Dias Rollemberg (Donana), tia avó da minha informante, trouxe da Europa um pano que achou muito bonito. Chegando em Aracaju, mostrou a uma contraparente negra chamada Juli Franco Maior. Era muito habilidosa e juntas tentaram ver se descobriam a técnica. Para isso tiveram que desmanchar um pedacinho. Juli morava em Divina Pastora e para lá levou a ideia que passou para Marocas, mulata também habilidosa tornando-se esta a primeira professora de Renda Irlandesa. Ensinou toda a família, constituída de sobrinha, cunhadas, e uma irmã mais moça chamada Ernestina Santos (Sinhá) que ainda é viva.” (IPHAN, 2009, p.34).

Artesãs da Associação para o Desenvolvimento de rende de Divina Pastora – ASDEREN-SE | Foto: Raquel Rezende.

Como parte considerável das técnicas têxteis manuais, a renda irlandesa se expandiu em Divina Pastora através das mulheres e das escolas que ensinavam “artes manuais” para meninas da cidade. Escolas religiosas que acreditavam que ensinando crochê, bordado, tricô ou renda, iriam educar mulheres a serem prendadas e boas donas de casa. Dentro desse lugar de subserviência feminina, as mulheres de Divina Pastora, em sua maioria negras, indígenas e com pouca ou nenhuma autonomia financeira, descobriram um ofício que transformou a realidade da cidade e de inúmeras famílias. A perpetuação dessa tradição acompanha a história de centenas de mulheres, que viram suas ancestrais criando delicadamente, ponto a ponto, com agulha, linha e lacê acetinado, rendas que fazem os olhos se perderem nos infinitos detalhes.

Poucas cidades no Brasil dominam essa técnica, que apesar de parecer com a renda renascença, guarda peculiaridades nos materiais e mais de 100 pontos utilizados, ganhando por isso o selo de indicação geográfica do INPI e o título de patrimônio pelo IPHAN em 2008.

Como se mantém um processo criativo?

Para criar uma peça de renda irlandesa é preciso tempo e olhar atento. Observação é ação importante, muitas artesãs relatam que aprenderam a fazer renda por sentirem curiosidade observando o puxar da agulha e da linha. Maria Isabel, em entrevista, conta que aprendeu pois sempre via as rendeiras nas portas das casas e queria se juntar a elas.

“Todo mundo costurava assim”.

Movimento das mãos que se repete despertando o desejo de aprender de mulheres de diversas idades a décadas. Dentro desse compartilhar, o protagonismo da generosidade feminina é típico do fazer artesanal. Conhecimento que se expande para não morrer, há o entendimento da importância em passar o que se sabe adiante para que seja lembrado e vivido por mais pessoas.

A partir da necessidade e do desejo de cuidar da memória e perpetuação da renda irlandesa, surge a ASDEREN – Associação para o Desenvolvimento de Renda de Divina Pastora. Criada em 1998, tem o objetivo de fortalecer a atividade no município e buscar reconhecimentos e apoios de instituições públicas e privadas para manutenção da tradição artesanal. Em 2000, a ASDEREN se consolida com apoio da Artesol. Oito anos após a criação da associação, a atividade foi reconhecida como patrimônio pelo IPHAN, o que mostra a potência da união das artesãs em busca de seus direitos e reconhecimentos.

Dentre as centenas de pontos, alguns são mais tradicionais e utilizados por todas as artesãs, como o ponto redinha. Mas segundo Verônica, artesã experiente da cidade:


“Nem todas as rendeiras sabem fazer todos os pontos pois é complexo e existem mais de 100 pontos diferentes”.

Risco, alinhavo e preenchimento fazem parte do processo de criação da tecitura delicada da renda. O tempo e a pausa se tornam essenciais para ver um trabalho finalizado. Espaços temporais necessários, como o processo de amadurecimento da vida em si. Não adianta a pressa atropelar processos de aprendizagem e isso as rendeiras de Divina Pastora entendem e ensinam.

Rendeira da Associação para o Desenvolvimento de rende de Divina Pastora – ASDEREN-SE | Crédito das fotos: 1 a 4. Raquel Rezende.

SOUZA DE OLIVEIRA, Heyse – Fios, lacês e INPI : história de vida e indicação geográfica (IG) na renda irlandesa em Divina Pastora-SE (2000-2017) – p. 38.

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