Janete Tariana
Janete Martins, da etnia Tariana, é habilidosa artesã que trabalha com trançado de tucum e arumã. Além de suas produções, apoia na divulgação das peças de outras artesãs das comunidades do Alto Rio Negro.
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Sobre as criações
Tucum e arumã
irmãs do povo de pé,
de fé e sonho.
Suas raízes brincam de nadar sem sair do lugar
e suas mãos, espalmadas no céu,
inspiram o trançado do Aturá
que ampara a seiva da mandioca
que escorre do ventre da mulher indígena.
Raquel Lara Rezende
A prática de trançar cestos é, para algumas etnias indígenas, como a Baniwa, um conhecimento central de sobrevivência no mundo. Com eles, as mulheres podem manipular a mandioca que constitui a base de sua alimentação. Assim como cesto, outras peças do artesanato produzido em São Gabriel da Cachoeira possuem profunda ligação com a vida indígena. São artefatos presentes no cotidiano das comunidades, na pesca, caça, agricultura, nos rituais e nas danças. O Aturá, por exemplo, uma cesta muito comercializada por conta do seu trançado, é utilizada nas roças para a colheita da mandioca.
Todo o processo de produção, incluindo o manejo da matéria-prima, compõe esse conhecimento expresso nas cores provenientes do tingimento natural, nos diferentes trançados feito com as fibras vegetais e nos desenhos que adornam ou dão forma aos objetos. Além da cestaria, Janete produz luminárias, biojoias e porta-joias (samburás) com as sementes da região que casam tão bem com a fibra de tucum e do cipó.
Sobre quem cria
Janete Mara Martins Lana é natural de São Gabriel da Cachoeira, do distrito Iauaretê, e faz parte do povo Tariana. Quando criança, ela via a avó fazendo bolsas e porta-joias com a fibra do Tucum. A mãe trabalhava com artesanato, e trocava as peças que produzia por roupas e outros víveres com povos de comunidades vizinhas. Quando Janete tinha apenas 13 anos perdeu o pai, que realizava as viagens para trocar os artesanatos e alimentos produzidos. Conta que durante esse período a família passou por dificuldades e então se mudou para São Gabriel, onde sua mãe foi apresentada à Associação de Artesãos Indígenas de São Gabriel da Cachoeira (ASSAI) e passou a trabalhar como associada. Janete se juntou ao grupo três anos depois, produzindo peças pequenas como porta-joias, brincos e pulseiras.
A Associação de Artesãos Indígenas de São Gabriel da Cachoeira (ASSAI) integra cerca de 30 famílias de diferentes etnias que produzem e comercializam artesanato. O grupo, para além da comercialização dos produtos, tem como preocupação a difusão da cultura indígena do Alto Rio Negro. Ao integrar a Associação, Janete passou por diversas oficinas oferecidas pelo SEBRAE e ministradas pelo designer Sérgio Matos. As oficinas eram voltadas à produção de peças maiores, como cestos e fruteiras de impressionante beleza.
Ela conta que aprendeu muito com as mulheres e artesãs da Associação, da qual foi secretária e depois coordenadora. A passagem no grupo foi fundamental pra sua formação enquanto artesã e liderança. Hoje ela não está mais vinculada à Associação, mas continua trabalhando exclusivamente com o artesanato, tanto de forma individual quanto com famílias que moram nas comunidades mais afastadas de São Gabriel.
A matéria-prima principal usada é a fibra vegetal das palmeiras de nome arumã e tucum. Os artesãos entram na mata em busca da planta que manejam de forma sustentável, tendo como base o conhecimento tradicional indígena herdado. Por se encontrar dentro de uma demarcação de Terra Indígena, os povos possuem licença para a extração de matéria-prima.
Sobre o território
O município de São Gabriel da Cachoeira fica às margens do Rio Negro, a 850km de Manaus, na região do Alto Rio Negro, conhecida como “Cabeça do Cachorro”. A cidade possui a maior proporção de indígenas do Brasil. Mais de 75% de sua população pertence a 23 etnias diferentes. Em São Gabriel são faladas 19 línguas indígenas, além do nheengatu, derivada do tupi antigo e usada como língua franca na Amazônia durante décadas, e do português. O ciclo da borracha impulsionou uma forte migração forçada ou espontânea de indígenas de outros países, outras regiões do Brasil e de brasileiros da região nordeste para São Gabriel. Nesse contexto, os movimentos de resistência indígena se fortaleceram e uma das muitas estratégias utilizadas foi o uso da língua nheengatu que continuou a ser falada, a despeito de sua proibição em 1758.
Marcada pela pluralidade linguística, São Gabriel da Cachoeira é a primeira e única cidade a ter outras línguas reconhecidas como oficiais, além do português. Em 2002, a cidade aprovou uma lei municipal que tornou o tukano, o baniwa e o nheengatu línguas co-oficiais.
A mandioca é a principal fonte econômica das comunidades indígenas e ribeirinhas e constitui sua base alimentar, com seus derivados como a goma para tapioca, farinha, farinha de tapioca, maçoca, tucupi, arubé e beiju. O artesanato também ocupa importante lugar na geração de renda das comunidades que usam por exemplo algumas fibras vegetais, como as palmeiras arumã e tucum.