Nando de Zezinho
José Fernando Marques da Silva é herdeiro da valiosa tradição aprendida com seu pai, mestre Zezinho. Alia à tradição sua vocação criativa inovadora que o provoca a imprimir uma estética contemporânea e elegante às criações, sem deixar de honrar o legado do pai e de tantos outros mestres conterrâneos.
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Sobre as criações
O lugar que é o berço pernambucano do artesanato feito em barro, terra de vários dos maiores artistas populares do Brasil nessa arte, é também território de feitio de santos, panelas, utilitários em geral e peças figurativas das mais diversas assim como tantos outros objetos possíveis com esse material tão permissivo e cotidiano. Assim denunciava um de seus maiores artistas, Mestre Nuca, falecido em 2014: “Em Tracunhaém ou barro vira santo ou vira panela”.
Transgredir essa sentença que carrega a tradição e a transmissão do manuseio do barro desde os tempos coloniais, não é uma tarefa fácil. Algo que o artesão Nando foi construindo aos poucos. Das imagens sacras que criava influenciado pelo estilo do pai, Mestre Zezinho, um dos precursores desse legado, saltou para a releitura das pinhas, peças decorativas usadas nas áreas externas das casas pelas famílias mais privilegiadas no período colonial para demonstrar riqueza. Com uma estética inteiramente renovada, as obras invadiram o universo da decoração em meados dos anos 2000 e hoje compõe lugar de destaque em mesas e salas compartilhando sofisticação com outras peças de arte, assim como a escultura “família”, outra de suas obras mais recentes. “O pai começou lá atrás com os santos, ele fazia todo tipo de peça: fazia santo, camponês, animal, fazia muita coisa! O pai era muito criativo! Tem muita obra que ele criava. Muita muita muita. E muita peça que eu acho que eu nem conheço de tanta que ele fez.”
Preocupado em manter os modos de fazer tal e qual o pai, Nando optou por manter o processo primitivo do modo de fazer. “Não colocamos máquina aqui pra não mudar aquilo que meu pai começou. Ele começou pisando o barro, cortando com a inchada a lenha, tudo manual.” Esculpidas à mão, e fruto de um trabalho intenso que se inicia no preparo do barro passando pela modelagem, secagem, queima e pintura das peças, Nando segue seguro como herdeiro dessa valiosa tradição mas à vontade com sua vocação criativa inovadora que o provoca a imprimir uma estética contemporânea e elegante às criações, sem deixar de honrar o legado do pai e de tantos outros mestres conterrâneos.
Sobre quem cria
José Fernando Marques da Silva, mais conhecido por Nando de Zezinho, começou na arte do pai desde muito pequeno. “Com 4 ou 5 anos, por aí, era pirralho mesmo. Bagunçava muito, era muito bagunceiro lá no atelier e já a turma que trabalhava com o pai na época dizem que eu era pimenta mesmo. Corria pra cá e pra lá, quebrando uma peça, quebrando outra e de repente fui pegando gosto por aquilo ali.” Filho do ceramista Zezinho de Tracunhaém, que fez da arte santeira a sua expressão maior, tornando-se um dos mais importantes artistas populares do Brasil, Nando herdou o rigor e perfeccionismo do pai. “Minha primeira peça fiz e não gostei, quebrei. E continuei a fazer”.
Dos nove filhos, sete deles trabalhando com o barro, Nando foi quem assumiu a responsabilidade pela continuidade da obra do pai. Junto com ele e o irmão Zé Carlos (Carlinhos), trabalham a mãe Maria Marques da Silva (que ainda produz algumas peças), os filhos homens, a irmã Angela (que Nando incentivou) e Andrea. Com a demanda por encomendas aumentando a cada dia, a tradição segue sendo transmitida para as gerações mais novas. O sobrinho Jonatas (filho de seu irmão) é o mais recente aprendiz e já domina a arte de aplicar os “bicos” da pinha, segredo que nem todo mundo pode saber. Seu filho é o próximo a ser introduzido na lida do barro. “Vem muita criança aqui, da escola, eles vem tudo de uma vez só. Veem o processo de produção das peças, vêem a queima, vêem o processo de pisar o barro, de catar o barro. Eu quero também passar isso pra outra geração pra que isso não morra, para que o que ele começou lá atrás com muita coragem possa ter continuidade e quando eu morrer, quando o outro morrer, isso possa ter continuidade.”
Sobre o território
Tracunhaém, terra do barro. Testemunha do florescimentos de alguns dos maiores artistas populares do Brasil. Uma pequena cidade localizada na Zona da Mata, à cerca de 72 Km de Recife, que abrigou muitos dos nossos mestres ceramistas como Mestre Nuca, Maria Amélia da Silva, Zezinho de Tracunhaém, Lidia Vieira. A importância da atividade na economia do município é tamanha que representa uma das principais fontes de renda para muitos moradores, junto ao cultivo da cana-de-açúcar.
Um lugar onde as feiras de trocas garantiam a saída da produção da cerâmica utilitária pela chegada do arroz, feijão, e outros mantimentos. Até a década de 1940 quando a arte figurativa ganhou seu lugar ao sol e os artesãos passam a criar esculturas, imagens religiosas, bonecos, figuras humanas e bichos e a cidade se transformou em um dos principais pólos ceramistas do Brasil. “Imagine uma cidade pacata que tem 13 mil habitantes mas que antes tinha bem menos. Era troca-troca de uma coisa com a outra, não tinha essa diversidade de peças, a qualidade de peças e o pai começou a mudar essa cara. Hoje Tracunhaém tem uns 400 ou 500 artesãos ou até um pouco mais. E saber que o pai, lá atrás, teve coragem de iniciar tudo isso, mesmo sem saber nem ler nem escrever, é muito importante.”
Artesão e empreendedor dedicado, Nando segue em seu atelier ao lado do irmão Carlinhos zelando pelo nome do pai garantindo as entregas em dia, o acabamento impecável e a qualidade que Mestre Zezinho não deixaria jamais passar em branco. “O pai passou tudo o que a gente sabe hoje. Na verdade, o que a família hoje é, deve ao meu pai, um guerreiro. Se você pensar: um camarada que mal sabe assinar o nome, um camarada que pra pegar um ônibus ele só pegava porque ele era muito desenrolado pra essas coisas, mas ele não sabia ler nem escrever, chega em Tracunhaém e com o barro muda a história dele, a historia da família, e muda a história de uma cidade. Um homem que não sabia ler nem escrever que morreu como mestre. Sem ir numa faculdade, sem ir numa escola.”