Coletivo Rendeiras da Lagoa da Conceição  


A renda de bilro é uma técnica muito presente no litoral brasileiro, especialmente no Nordeste e no Sul, especialmente em Santa Catarina, onde representa um importante elemento de identidade do estado.

Mostrar contatos

AbrirFechar

Os contatos devem ser feitos preferencialmente via Whatsapp.

Telefone (48) 98866-5949
Contato Monica Vieira de Alencar
Rua Henrique Vera do Nascimento, 50, Lagoa da Conceição, CEP 88010-102, Florianópolis – SC

A Artesol não intermedeia relações estabelecidas por meio desta plataforma, sendo de exclusiva responsabilidade dos envolvidos o atendimento da legislação aplicável à defesa do consumidor.

Sobre as criações

Rendeira, velha rendeira, 

com quem aprendeu a rendar? 

Foi com a onda faceira,  

Na praia bordando o mar.  

Velha Rendeira

A renda de bilro é uma técnica muito presente no litoral brasileiro, especialmente no Nordeste e no Sul, especialmente em Santa Catarina, onde representa um importante elemento de identidade do estado. A renda de bilro catarinense foi trazida pelos colonizadores açorianos no século XVIII, e difundida em toda a ilha, ensinada nos lares, transmitida de geração em geração, de modo a se tornar parte da cultura local.  

O seu nome se deve aos instrumentos utilizados para tecer, os chamados bilros, fusos cilíndricos de madeira, esculpidas à mão ou com auxílio do torno, que são utilizados aos pares. É nele onde a linha é enrolada para a confecção da trama, como em uma bobina. Em Florianópolis, a madeira utilizada para produzir os bilros era o rabo-de-macaco, Lonchocarpus guillemineanus (Tul) Malm, que atualmente não pode ser utilizado, por se tratar de uma madeira protegida, sendo substituída por outros tipos de madeira. Utilizam, além de bilros e fios, o pique, um gabarito em papelão que contém o desenho da renda a ser executada, alfinetes, que prendem os pontos da renda conforme o desenho do pique; uma almofada, um saco de chita preenchida com fibras naturais,  por sua vez, fica apoiada no cavalete, cangalha ou caixote. Na prática, a renda é produzida com um movimento ágil das mãos das artesãs que movimentam os bilros no ar, como em um balé de fios. O ritual, que é embalado pelas batidas ritmadas da madeira, resulta em um trabalho extremamente delicado. 

Crédito da foto: Pedro Malamam

Os piques, gabaritos da renda em papelão furado, são um tesouro que possibilitam a reprodução de peças, e registram os diferentes tipos de renda produzidos pelo coletivo: tramoia, maria-morena e tradicional. Os piques são furados manualmente, com agulhão, tendo como referência uma peça de renda, ou um outro pique. O grupo mantém um acervo com piques de rendeiras de toda a ilha, a Piqueteca, desenvolvida por Nice Nunes, o que permite dar continuidade à tradição da renda, e se converte em uma fonte de estudos sobre as mudanças e continuidades entre a renda que se fazia no passado e a que se faz hoje. Já as almofadas são feitas com chita e preenchidas com como capim-colchão, palha de bananeira, barba-de-velho ou macela. As dimensões da almofada podem variar, a depender do tamanho do pique e da peça que se pretende produzir. 

As rendeiras da Lagoa da Conceição utilizam, em sua maioria, fios de algodão, tanto mais finos quanto mais grossos, a depender do tipo de peça. Trabalham com três tipos de renda, elaborados a partir de combinações de pontos: a renda Tradicional, a Maria Morena e a Tramoia, em processo de se tornar Patrimônio Imaterial da região.  A partir da combinação de fios, cores e pontos, confeccionam peças de vestuário, como vestidos, coletes, saídas de praia, lenços, xales, bolsas, aplicações, biquinhos e entre-meios – usados para aplicação em roupas, assim como peças para a casa, toalhas de bandeja, porta-copos, caminhos de mesa, quadros, toalhas de mesa, colchas e estandartes. As peças são tipificadas por tipo renda e motivos: geométricos, abstratos, desenhos figurativos da fauna e da flora local, além de desenhos inspirados a pessoas, mais recente, além de outros seres que encantam as rendas.  

Sobre quem cria

A expressão da renda de bilro se mantém viva em Florianópolis por meio da transmissão da técnica no ambiente familiar, de geração em geração. No passado, cabia às mulheres mais experientes da casa, mães, avós, primas e irmãs mais velhas a tarefa de ensinar a prática às mais novas. A produção de roupas e a renda antigamente eram responsabilidades ditas femininas, conforme destaca Monica Alencar em sua Dissertação de mestrado publicada em 2022. A autora menciona uma citação de Franklin Cascaes, em entrevista para Caruso, publicada no livro Vida e Cultura Açoriana em Santa Catarina: “Segundo Franklin Cascaes, em entrevista para Caruso (1997), “a profissão obrigatória da mulher era o tear, o homem cuidava da agricultura e da pesca e a mulher batia e tecia o algodão, descaroçava o algodão, fiava, torcia, ensarilhava, dobrava, urdia e depois levava a trama para tecer, os panos e a costura, além do bordado e da Renda, eram feitos em casa, inclusive o tingimento natural com fel de búzios e erva de anil”. A renda gerada a partir da produção da renda de bilro era um importante complemento da renda para as famílias.  

Crédito da foto: Pedro Malamam

Grande parte das rendeiras do grupo de rendeiras da Lagoa da Conceição contam que aprenderam a rendar quando meninas, com suas familiares. A rendeira mais experiente, Judite Vieira, conta ter aprendido aos sete anos e em 2025, tem 94 anos. Um retrato da resistência da transmissão do ofício da renda, o que confirma sua relevância como patrimônio cultural do estado.  

Com as transformações socioeconômicas dos séculos XX e XXI, em que os trabalhos manuais perderam espaço para outras atividades no mercado de trabalho, muitas rendeiras que aprenderam quando meninas trabalharam em outros ofícios e retomaram, após aposentadas, a atividade. Voltam a rendar com saudades, com carinho e a alegria de fazer algo que lhes dá tanto orgulho.  

O grupo conta com cerca de 60 pessoas, em sua maioria mulheres, que rendam sozinhas em casa, mas adoram se encontrar para contar histórias, distribuírem encomendas, trocarem experiências e aprendizados. O Centro Cultural Bento Silvério (CCBS) é seu ponto de encontro, no qual rendeiras de toda ilha se reúnem segundas, quartas ou sextas-feiras, se distribuindo nas salas do belo Casarão para rendar. Lá também são ministradas oficinas de renda que atraem mulheres e homens de diferentes idades e turistas que admiram a técnica por sua beleza e relevância cultural.  

Crédito das fotos: Pedro Malamam

Tradicionalmente, as rendeiras trabalhavam cantando versos de Ratoeira, uma brincadeira de roda que animava o trabalho. O nome “ratoeira” é inspirada na armadilha usada para conquistar os pretendentes.  

Além de rendarem, algumas das artesãs desenvolvem um trabalho de resgate e pesquisa da Ratoeira desde 2022, uma dança em roda que é cantada e dançada, acompanhada por violão. Em suas apresentações, as rendeiras e Rendeiras e Cantadeiras, adornadas com suas rendas, fazem uma roda e entoam cantigas sobre seu ofício na renda, causos amorosos e outras canções populares. A celebração mantém viva a tradição da Ratoeira e proporciona um belo encontro entre as tradições catarinenses, que são experienciadas e transmitidas em toda sua beleza. 

Sobre o território

Durante muito tempo, as rendas foram, juntamente com a pesca e a agricultura, uma das principais atividades econômicas de Florianópolis. As rendeiras da cidade herdaram a tradição dos imigrantes açorianos que chegaram no século XVIII e hoje estão espalhadas por toda a ilha, especialmente na praia da Armação, um recanto entre o mar e a frondosa Mata Atlântica, no sul da cidade, e também na costa da charmosa Lagoa da Conceição. Lá elas dão nome à principal avenida do bairro, a Avenida das Rendeiras. 

O lugar cativo das artesãs é o Centro Cultural Bento Silvério (CCBS), que abriga o Centro de Referência da Renda de Bilro de Florianópolis, conhecido como Casarão das Rendeiras, que está sob responsabilidade da Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes. O Casarão foi inaugurado em 1912, projetado para abrirar uma antiga estação rádio-telegráfica, foi tombada como patrimônio histórico pelo município em 1985. Aberto a veteranas ou iniciantes, o espaço abriga exposição de peças e apetrechos, loja de comercialização para turistas, cursos e oficinas semanais. A proposta é proporcionar a reciclagem, a troca de informações e a modernização do trabalho e ainda estimular pesquisas nas áreas de moda e design focadas na técnica para valorizar a tradição secular. As atividades do Centro de Referência da Renda de Bilro não ficam restritas ao Casarão da Lagoa, outras comunidades como Sambaqui, Pântano do Sul, Rio Vermelho e Estreito são beneficiadas com oficinas de renda de bilro e um curso de gestão para as rendeiras. 

Crédito da foto: Pedro Malamam

Monica Alencar (2022, p. 48) afirma que, além do acervo de rendas de bilro mantido no Centro de Referência, há outros dois na ilha, mas que não são acessíveis ao público, como a Piqueteca, organizada por Nice no Casarão: 

“Além do Centro de Referência da Renda de Bilro e dos demais núcleos de rendeiras que preservam o saber-fazer tradicional, Florianópolis possui dois acervos da Renda de Bilro; ambos fazem parte da coleção de cultura popular do Museu de Arqueologia e Etnologia Professor Oswaldo Rodrigues Cabral, da Universidade Federal de Santa Catarina”.  

Membros relacionados

Patrocínio
Institucional Master

Realização

Opções de acessibilidade