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Sobre as criações
Pencas de jacas modeladas à mão que, junto ao nascimento do filho, se frutificaram. Assim a artesã Adriana Siqueira construiu o início de sua história junto ao barro. Símbolo da região, a jaqueira foi trazida da Índia para o Brasil no século XVII e adaptou-se muito bem ao clima quente e úmido do litoral atlântico. Provém sombra em dias de sol escaldante e frutos conhecidos por sua dimensão grandiosa (uma única jaca chega a pesar de até 10 kg), apreciados por pequenos mamíferos típicos da mata atlântica, como quatis e micos-estrela. Abundante no município de Capela, sua terra natal, foi o símbolo que despertou Adriana para a vocação de artesã.
Primeiro ela “levanta” a jaca – ocas por dentro – modelando habilmente o barro até que se feche. Depois a artesã deixa “enxugar”, ou seja, a peça aguarda que a água contida na argila evapore durante cerca de 24 horas. Então, um a um, manualmente, os “picos” são modelados na peça que vai ganhando um aspecto realista, uma etapa extremamente delicada e demorada, preenchida por barro e paciência. Em seguida ocorre mais uma fase de secagem, por mais três dias inteiros, antes que a peça esteja pronta para ir ao forno. Só então ocorre a queima.
Terminada a queima, Adriana espera um dia para abrir o forno e a peça está pronta. Junto com os outros artesãos, fazem a queima, compram a madeira, coletam o barro. Dividem tudo, a começar pelo atelier. “Quando os meninos tem peça pronta junta todo mundo e queima.” A matéria prima, o barro, encontram disponível logo atrás do atelier. Contratam um rapaz para retirar, quebrar, pisar e deixar o barro pronto para o uso, uma etapa pesada e trabalhosa. “A gente não faz mistura não, nenhuma. Pisa, peneira, pisa de novo junto com a água para ficar pronto para uso. Não falta barro não. Eu trabalho bem perto dele. Quanto mais cavar mais aparece barro bom.” Com o barro preparado, ele é armazenado em sacos e acomodado sob sua mesa de trabalho, por uma semana ao menos antes de ser manuseado. “Quanto mais ele curtir, mais ele fica melhor, vai pegando a liga, as peças não racham, e se for trabalhar diretamente com o barro tirado hoje mesmo, corre o risco de estourar quando faz a queima.”
Sobre quem cria
Adriana Maria da Silva Siqueira é irmã de Tita e Sil, artesãs já consagradas em Capela. Foi através delas que se aproximou da arte do barro. Adriana trabalhava como doméstica, engravidou e ficou desempregada. Quando o filho nasceu, contou com o seguro desemprego por seis meses para se sustentar. Depois disso precisou encontrar uma alternativa de trabalho que conciliasse os cuidados de um filho pequeno. Foi quando passou a frequentar a oficina do mestre João das Alagoas e ajudar Sil em pequenas tarefas, peneirando, amassando o barro e logo depois colaborando em suas encomendas. “Comecei a ajudar minha irmã Sil e ela estava precisando das jacas pequenas para uma encomenda grande. Eu não sabia fazer e ai ela me disse: Como você não sabe se você nem começou?”
Sil a ensinou e Adriana começou a produzir. Aprendeu a fazer e não parou mais. Trabalha como artesã há cerca de nove anos. Com a habilidade assegurada, também foi a irmã Sil que a provocou a produzir jacas maiores: “Porque tu não tenta fazer umas maiores?” Adriana então foi aumentando, pouco a pouco, o tamanho das peças, até alcançar a versão maior, que possui entre 50 cm a 60 cm. Encontrou e consolidou sua identidade, guiada pelo respeito entre os colegas artesãos e ensinamentos do mestre: “O João sempre falava: você tem que ter a sua própria marca.” Os cliente da irmã e do Mestre João vinham visitá-los, viam suas peças e gostavam. Assim foi dando continuidade ao ofício. “Não voltei nunca mais a trabalhar como doméstica.”
Sobre o território
Capela é um pequeno município localizado na zona da mata alagoana que se tornou referência na arte do barro graças ao grande mestre João das Alagoas, homem generoso, de sensibilidade apurada, que transmitiu seus saberes a uma geração inteira de artistas, hoje com projeção e reconhecimento. Um lugar que se tornou um dos celeiros da nossa arte popular, reunindo a produção de alguns dos nossos principais artistas do barro. São atualmente em um grupo de nove artesãos, unidos em torno de uma associação que mantém juntos mas onde cada um é dono de seu próprio trabalho.
De lá, as peças de Adriana ganham o país. Atendendo encomendas e distribuindo-as por lojas e galerias de todo o Brasil, diariamente se debruça sobre o barro bruto modelando um dos símbolos de seu lugar de pertencimento e dando vida ao barro retirado do quintal. “Para mim o artesanato é tudo porque antes eu dependia dos outros e hoje eu tenho meu trabalho, dependo da minha própria arte. Consegui dar o melhor para o meu filho através da arte, tudo o que eu tenho é através da arte. Eu me sinto realizada.”