A Rede Nacional do Artesanato Cultural Brasileiro é uma iniciativa da Artesol, organização sem fins lucrativos brasileira, fundada em 1998 pela antropóloga Ruth Cardoso. Seu objetivo principal é promover a salvaguarda do artesanato de tradição cultural no Brasil. Por meio de diversas iniciativas, a Artesol apoia artesãos em todo o país, revitaliza técnicas tradicionais, oferece capacitação, promove o comércio justo e dissemina conhecimento sobre o setor.

Ulisses Mendes


No barro, Ulisses modela o sofrimento de seu povo em um misto de crítica social, religiosa e cultural. É um artista precioso pela dramaticidade que imprime às peças, sem “adoçar” os olhos de quem as vê, apesar da suavidade e delicadeza dos traços.

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Sobre as criações

O trabalho de Ulisses Mendes traz sua vivência como lavrador e morador da pequena Itinga. Mulheres no fogão de lenha, escravas das histórias que ouviu dos pais, tropeiros montados em cavalos ou éguas moribundas, trabalhadores rurais embriagados nos dias de feiras na cidade, canoeiros de quando o rio Jequitinhonha era farto de água e a cidade dividida por um rio. As peças mais emblemáticas são os lavradores e lavradoras, o homem da roça desempregado ou a mãe carregando o filho, crucificados, no lugar de Cristo, pela seca que assola a região. Imagens que denunciam a pobreza, o desencanto, o esquecimento e sofrimento. No barro, Ulisses modela o sofrimento de seu povo em um misto de crítica social, religiosa e cultural. É um artista precioso pela dramaticidade que imprime às peças, sem “adoçar” os olhos de quem as vê, apesar da suavidade e delicadeza dos traços.

Os momentos pelo rio Jequitinhonha, as andanças pelos matos, roças, cantões e brejos em busca de novas argilas, pigmentos e plantas para a queima das peças fazem parte de um ritual de reclusão para aguçar o olhar, desanuviar, descobrir coisas e depois transformá-las em arte. Nos barreiros a beira da lagoa, Ulisses retira o barro, examina, amassa. Depois soca, amassa novamente e “envelhece” por 30 dias. Deixa “curtir”. Aí sim, produz as peças. Mas sua matéria, para além do barro, é o cotidiano do povo. 

Sobre quem cria

Ulisses Mendes é hoje, aos 64 anos, um dos expoentes do artesanato do Vale do Jequitinhonha, dos mais importantes e representativos artistas mineiros. Sua obra tem alcance internacional, reconhecido com peças em museus, coleções particulares e públicas. Ministra oficinas em todo território brasileiro e é considerado um dos grande mestres nesse ofício, reconhecido pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Itinga entre outras homenagens. Participa de seminários, ministra palestras e oficinas no Vale do Jequitinhonha e fora. Não abre mão dos conselhos e colaboração do amigo Vilmar Oliveira, especialista em gestão estratégica em política pública e fotógrafo a quem confia o auxílio para vários convites.

Ele começa a desenvolver sua arte na infância. Os parentes mais velhos, “artesãos barrocos”, faziam potes, panelas e utensílios de cozinha. Observador, fazia pequeninas cópias. Ajudava a mãe em atividades “para homens”: a extração do barro no barreiro, a preparação da massa e o comércio das peças. Modelar o barro, poucos homens se atreviam. No inicio ele sofreu muito preconceito, até de irmãos: “Mãe! Põe esse vagabundo prá ir pro mato pegá lenha! Fica aí só mexendo com bolo de barro!”. Pouca coisa mudou, conta-se nos dedos os ceramistas homens no Vale do Jequitinhonha. Aos 16 anos, empregado na olaria do irmão, transformava restos de tijolo “naquelas casinhas” e foi “pegando gosto”. 

Filho de lavrador, “não tinha profissão”. Trabalhava na roça, fazia tijolo, pescava, garimpava com o pai, fez “um monte de coisa”. Em 77 segue para São Paulo trabalhar e volta no fim de 78 pretendendo retornar mas uma forte chuva desaba e muda seus planos. Tinha tempo que não chovia. Vem a inundação. Presenciou a catástrofe que arrasou casas ribeirinhas num rastro de perdas, tristezas e doenças. Resolveu recriar aquele cenário. Deu para fazer réplicas das casas destruídas, caídas, envergadas. Encomendas surgiam de Araçuaí, de Itaobim, de Jequitinhonha, de todo canto onde o rio avançou. Não parou mais. Mais adiante decide fazer personagens do seu dia-a-dia. 

Sobre o território

Ulisses é natural de Itinga, onde vive até hoje, pequena cidade que margeia o Rio Jequitinhonha. Uma das de menor índice de IDH no estado de Minas Gerais, onde o ofício de artesão ocorre nos núcleos familiares ou em comunidade, perpassadas por gerações. Seu ateliê, nos fundos de sua casa, ao lado do “forno de queimar as peças” é cenário de vidros de água de barro, instrumentos, objetos e os personagens, contando histórias. Conhecido como o cronista da cerâmica do Vale do Jequitinhonha, Ulisses utiliza as mãos, as palavras e a sabedoria de homem do cerrado em um discurso articulado sobre o papel do artista na sociedade atual. Apenas sonha com um acervo para a posteridade. 

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