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Sobre as criações
José Abias da Silva, 52 anos, tem uma facilidade espantosa para ver arte entre galhos, raízes e troncos caídos que colhe nas redondezas de casa, na mata do Engenho Novo, Igarassu. Dá novos significados ao que para muitos seria apenas resíduo. O trabalho é demorado e respeita os ciclos da natureza: quando a madeira ainda está verde, é preciso deixá-la secar e só na sequência, lixar. O resultado aparece na forma de figuras inesperadas. Um universo povoado por bailarinas, músicos, personagens da cultura pernambucana como o caboclo de lança, beija-flores, tatus, iguanas, outros animais da fauna brasileira, e registros da infância e adolescência. Até móveis, como bancos, cadeiras e extraordinários suportes para mesas com design contemporâneo e rodas-gigantes, que impressionam pela riqueza de detalhes. Um diálogo com a natureza gravado em galhos e troncos, autoproclamado “arte no galho”.
Abias trabalha com todas as madeiras: “Muita gente capina e limpa os terrenos perto da minha casa e eu saio atrás das sobras. Às vezes olho para o galho e já sei como a peça pronta vai ficar”. Sapotizeiros, aroeiras, jaqueiras, biribas, ingazeiras, transmutam-se e ganham significado singular. Esculturas que tem como identidade o respeito aos movimentos e formas “talhadas” pela natureza. “Eu apenas dou forma à madeira. Não derrubo nenhuma árvore para realizar meu trabalho”. Abias recorre a ferramentas simples, como facas e foices, adaptando-as e transformando-as em novos instrumentos de trabalho.
Sobre quem cria
Antes de se tornar artista popular, a sobrevivência o forçou a seguir por outros caminhos: trabalhou como garçom, vigia, operário e pedreiro, mas nunca abandonou a escultura em madeira, habilidade descoberta na infância como recurso para dar forma aos brinquedos que não podia comprar. Já fez artesanato com côco, sementes, até um amigo lhe desafiar, em tom de brincadeira, a criar algo a partir de um galho de araçá enquanto capinavam um terreno. Seis dias depois, a primeira escultura: a figura longilínea de uma passista de frevo fincada em uma base de madeira. Próximo aos 28 anos, dá-se o encontro do mestre com a arte. A partir daí se concentrou em criar a partir de galhos e raízes.
Em 2000, trabalhando como garçom, aproveitou o espaço no restaurante para apresentar algumas peças autorais. Vendeu a primeira escultura e adquiriu confiança para deixar o emprego e seguir seu impulso artístico. Logo despertou interesse em colecionadores, arquitetos e designers. Em 2004 participou pela primeira vez da Fenearte, considerada a maior feira de artesanato da América Latina. Em 2007, incentivado pela então coordenadora do Programa do Artesanato Brasileiro em Pernambuco (PAB/PE), concorreu ao Salão de Arte Popular Ana Holanda, conquistando o primeiro lugar com a peça Lampião e Maria Bonita. Foi destaque nas edições de 2008 (A Orquestra), 2009 (Cidade do Interior), 2012 (Feira Livre) e 2015 (Roda Gigante) e há cinco anos integra a Alameda dos Mestres. Em 2016 teve o trabalho destacado pela Casa Cor Pernambuco. “Até então não compreendia o valor estético e artístico do meu trabalho”.
Sobre o território
Nascido e criado no Engenho Novo, em Igarassu, o terreno onde mora, de dois hectares, foi comprado pela mãe há mais de 40 anos com a renda obtida por serviços prestados como doméstica. O artesanato deu ao mestre condições de construir uma casa de alvenaria, em contraste com a casa de taipa onde foi criado e que hoje serve de depósito. O próximo passo é terminar a reforma e concluir o ateliê, ao lado. O local mal parece estar a 20 quilômetros do Recife: com árvores frutíferas e animais andando pelo terreno, o clima é de sítio do interior. É nesta tranquilidade que Mestre Abias desenvolve suas obras. Mora com a mãe, já aposentada, e a irmã. Às vezes conta com a ajuda da namorada, Celina Vital, que também é artesã e cria flores de madeira, especialmente girassóis. A cidade tem, por sinal, outros artistas que trabalham com madeira: Moizés Vital, irmão de Celina, e um primo de ambos, Roberto Vital. Abias tem também um discípulo: Márcio, casado com sua prima. “Ele é muito prestativo e habilidoso. A gente aprende junto. Trocar ideia é muito bom. Acho que você não ensina uma pessoa a ser artista. Um artista simplesmente descobre o outro”.
“O professor não faz o artesão; ele apenas o auxilia em sua própria descoberta”.
“Hoje, o artesanato é tudo para mim, pois ele mudou minha vida. Antes, eu trabalhava para os outros. Agora, trabalho para mim mesmo e, de galho em galho, consegui fazer minha casa”.